No país dos contrastes, é sempre oito ou oitenta: No verão não tem noite e no inverno quase não temos dia!
Bom, brincadeiras a parte este é um assunto sério e a falta de luz pode causar distúrbios neurológicos e físicos. O finlandês enfrenta todo os anos um longo período de escuridão entre meados de Novembro até a metade de Janeiro. A cidade mais ao norte do país tem 56min de luz e nós aqui no sul, mais sortudos temos 6h de claridade. Amanhece às 9:30 e lá pelas 15:30 já está tudo escuro. O sol raramente é visto nestes meses e as pessoas começam a perder as forças físicas, sentindo-se cansadas e desanimadas e um processo de depressão pode inciar-se muito facilmente, chegando a consequências desastrosas. É o que aqui se chama efeito Kaamos. Em português conhecido como a “noite polar”.
Quando acaba a agitação do Natal e Ano Novo o que resta é o frio e a escuridão. Quase um por cento dos finlandeses sofrem de depressão profunda do inverno ou depressão de Kaamos e outras mais que são afetadas com alguns dos sintomas. Eu mesma acho estes meses de escuridão extremamente difíceis. É difícil acordar cedo, ter ânimo para fazer as coisas de sempre, é difícil manter a atenção e o foco e a sensação de cansaço é muito forte.
Todos os anos os finlandeses debatem muito como tratar estes sintomas e evitar que quadros mais graves de depressão apareçam neste período e evoluam para doenças psicológicas ou mesmo físicas. Dezembro é um mês que procura-se esquecer a escuridão adminrando-se as luzes e enfeites de natal e concentrando a atenção nas compras e festividades que estão por vir. Mas depois, acabam-se as festas e volta-se à rotina lá pelo dia 7 de janeiro.
O sol não aparece mais, os dias são todos nublados e a única coisa que pode-se ver é uma luz difusa que nos confirma que tecnicamente, ainda é dia. Quem sai para trabalhar pela manhã e volta a tarde não vê a luz do sol a semana toda. Uma vez ouvi no rádio que os finlandeses se transformavam em homens morcegos só que sem o glamour do Batman, mais como vampiros mesmos.
É difícil ficar feliz quando o tempo é triste! Para isto muitas alternativas nos ajudam a suportar a escuridão: aumentar a dose de vitamina D, exercícios físicos, uso de uma lâmpada terapêutica de luz brilhante e uma espécie de fone de ouvido que envia a mensagem de luz diretamente para o cérebro, procurando dar a sensação de equilíbrio que o organismo perdeu com a falta de luz e, consequentemente, agindo automaticamente fazendo com que o cérebro aumente as doses de dopamina que encontram-se baixas.
A depressão de Kaamos é muito mais séria do que a depressão comum porque ela mexe com o organismo, na medida que o seu relógio biológico fica afetado pela longa escuridão. O corpo não reage normalmente e a mensagem é para diminuirmos nosso rítmo e descansarmos mais. Significaria que deverímos entrar em uma espécie de hibernagem, como os ursos.
A questão é que em nossa sociedade moderna, a vida continua do mesmo jeito corrida, com ou sem luz e na medida que somos forçados a forçar o nosso organismo a continuar no mesmo ritmo, sofremos as consequências. Distúrbios de sono e alimentação são sintomas do efeito. Eu, por exemplo não consigo comer certas coisas nesta época, noto que deixo de comer iogurte, a maioria das frutas e sucos que tanto gosto, notando em em mim mesma alguns destes sintomas. Mas há casos de perdas severas de apetite que podem comprometer fisicamemente o indivíduo.
No caso dos expatriados este período é considerado um dos mais difícies
No momento em que escrevo este texto o relógio do computador marca 15:06 e eu olho pela janela na minha frente e vejo um céu cinzento escuro de fim de tarde e lembro como nos primeiros anos isto me angustiava. Lembrava do Brasil, da hora do café das três, do sol entrando pela janela e aquela situação parecia surreal demais. Onde estou? Como vim parar aqui? Como o dia ficou tão curto de repente?
Dizem os pesquisadores que a depressão de Kaamos atinge também outros países como a Inglaterra e Europa central. Talvez, mas eu tenho certeza que por causa da latitude, a Finlândia é um dos países que mais sofre deste mal, explicando o motivo, por exemplo, do alto índice de alcoolismo que temos aqui.
Felizmente em meados de janeiro os dias começam a ficar mais longos e a neve branca que cobre tudo nos dá alguma luz. O consolo é pensar que são apenas alguns meses e que logo virá a primavera e os dias ficarão mais longos.
Ter consciência das causas destes sintomas é de grande ajuda. Saber que é algo temporário e que a pessoa pode se prevenir controlando a sua alimentação, tomando vitaminas, fazendo esportes, curtindo a família e não se entregando a solidão. Encontrar-se com as amigas brasileiras para um café e um bom bate papo tem funcionado para mim como uma das melhores terapias para estes dias de escuridão. Afinal, é só uma questão de tempo: o sol vai voltar!
Este artigo originalmente foi escrito para o blog “Brasileiras pelo Mundo”www.brasileiraspelomundo.com
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